As negociações coletivas de trabalho são frutos da autonomia privada coletiva, um princípio segundo o qual grupos organizados da sociedade civil podem autorregular seus próprios interesses, com respaldo jurídico e eficácia reconhecida pelo Estado. No contexto das relações de trabalho, essa autonomia coletiva ganha destaque justamente por buscar compensar a desigualdade de poder existente entre empregados e empregadores.
A função protetiva das negociações coletivas
Enquanto, individualmente, o trabalhador costuma ter pouco poder de barganha devido à sua subordinação e à assimetria de informações na relação empregatícia, a negociação coletiva permite o equilíbrio de forças.
Dessa forma, o ordenamento jurídico brasileiro, visando diminuir a desigualdade entre os agentes desta relação e equilibrar as forças, prevê, a título de exemplo, que somente a negociação coletiva pode alterar uma cláusula contratual trabalhista que cause prejuízo ao trabalhador (art. 468 da CLT), ou que possa reduzir o salário deste (art. 7º VI da Constituição Federal).
Além do mais, a Constituição Federal, em seu art. 8º, inciso VI, estipula que essas negociações coletivas devem obrigatoriamente envolver a participação de sindicatos de trabalhadores (sindicatos profissionais).
Com isso, o objetivo do legislador constituinte foi equilibrar os interesses patronais e laborais para tentar, assim, evitar a supremacia de uma sobre a outra, ficando aptas as partes a negociar em nome dos seus interesses, reduzindo a necessidade de proteção por parte do Estado.
Quando se concretizam, as negociações coletivas se tornam instrumentos jurídicos e, portanto, fontes formais de Direito, cujo conteúdo tem aplicação cogente sobre os contratos individuais de trabalho; ao menos enquanto o instrumento coletivo estiver em vigência.
As negociações coletivas de trabalho são divididas em acordos coletivos e convenções coletivas. Em ambos os casos, a presença do sindicato profissional da categoria, que representa os trabalhadores, é obrigatória para que o instrumento da negociação seja válido.
Acordos e convenções coletivas
- Convenções Coletivas de Trabalho (CCTs): firmadas entre sindicatos de trabalhadores e sindicatos patronais, valendo para toda a categoria na região.
- Acordos Coletivos de Trabalho (ACTs): celebrados entre um sindicato e uma ou mais empresas específicas, valendo apenas para os funcionários dessas empresas.
Ambos os instrumentos têm efeito vinculante e se sobrepõem aos contratos individuais de trabalho, durante sua vigência.
O impacto da Reforma Trabalhista de 2017
Um dos motivos para o surgimento da Reforma Trabalhista (Lei 13.467, de 2017) foi, exatamente, valorizar as negociações coletivas de trabalho.
Até 2017, as negociações coletivas só poderiam ter prevalência sobre a lei trabalhista, caso houvesse previsão na Constituição Federal. Contudo, a partir da Reforma, com a inclusão do art. 611-A na CLT, passou-se a permitir a preponderância da autonomia negocial coletiva sobre a legislação em 15 outras matérias:
Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre:
I – pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais;
III – intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas superiores a seis horas;
IV – adesão ao Programa Seguro-Emprego (PSE), de que trata a Lei no 13.189, de 19 de novembro de 2015;
V – plano de cargos, salários e funções compatíveis com a condição pessoal do empregado, bem como identificação dos cargos que se enquadram como funções de confiança;
(…)
Ou seja, nessas matérias, se as partes (empregado e empregador) realizarem uma negociação coletiva (acordo ou convenção) prevendo algo diferente do que dispõe a legislação laboral, elas devem seguir o que foi negociado.
No entanto, a Reforma Trabalhista também acrescentou à CLT o art. 611-B, que passou a prever a proibição expressa a prevalência dos instrumentos coletivos de trabalho sobre a lei nas seguintes matérias:
Art. 611-B. Constituem objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, exclusivamente, a supressão ou a redução dos seguintes direitos:
I – normas de identificação profissional, inclusive as anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II – seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;
III – valor dos depósitos mensais e da indenização rescisória do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS);
V – valor nominal do décimo terceiro salário;
(…)
Com a inclusão desses dois artigos, a Reforma Trabalhista, portanto, quis atingir seu objetivo inicial de dar maior ênfase à autonomia privada coletiva, mas sem deixar de listar matérias em que as negociações coletivas não pudessem prevalecer sobre o que se encontra positivado na lei. Isso ocorreu porque, em algumas negociações, podem surgir externalidades negativas e outras falhas de mercado, exigindo maior regulamentação por parte do Estado.
O legislador, portanto, definiu um quid mínimo em que a autonomia privada não terá lugar, subtraindo das partes – empregados e empregadores – a possibilidade de transigir a respeito delas. Nesse ponto, o Estado entendeu por bem definir exaustivamente as matérias que podem e as que não podem ser objeto de negociação coletiva.
Novos desafios: a negociação coletiva diante do trabalho remoto
Com o avanço da tecnologia e o crescimento do trabalho remoto e híbrido, principalmente após a pandemia da COVID-19, surgiram novas demandas nas relações laborais que vêm sendo enfrentadas, em grande parte, por meio das negociações coletivas.
Questões como:
- controle de jornada fora do ambiente físico da empresa;
- fornecimento de equipamentos e infraestrutura;
- reembolso de despesas com internet e energia;
- desconexão digital (o direito de não responder mensagens fora do expediente).
Essas novas situações passaram a exigir acordos específicos entre empresas e trabalhadores, já que a lei, muitas vezes, não consegue acompanhar, no mesmo ritmo, as mudanças rápidas do mundo do trabalho.
Dessa forma, sindicatos têm desempenhado papel estratégico, ajustando as normas às novas realidades, de modo a proteger tanto os direitos dos trabalhadores quanto a sustentabilidade das empresas.
Exemplos de direitos oriundos de negociações coletivas de trabalho
Alguns benefícios e direitos amplamente praticados no mercado de trabalho brasileiro decorrem, exclusivamente, de negociações coletivas. Por exemplo:
- Vale-alimentação: não é previsto na legislação, mas passa a ser obrigatório se estiver previsto em convenção ou acordo coletivo;
- Pisos salariais por categoria: podem ser superiores ao salário-mínimo nacional e devem ser respeitados pelas empresas;
- Cláusulas de estabilidade provisória: muitas negociações coletivas preveem estabilidade após retorno de licença médica, gestação ou pré-aposentadoria, mesmo sem previsão legal.
Considerações finais
As negociações coletivas são instrumentos essenciais na promoção do equilíbrio entre capital e trabalho. Elas permitem que empregadores e empregados definam, de forma democrática e representativa, as regras do jogo laboral, respeitando os limites legais estabelecidos.
Com a Reforma Trabalhista e o surgimento de novas formas de trabalho, a negociação coletiva tornou-se ainda mais relevante. Em um cenário de constantes transformações, o fortalecimento do diálogo entre as partes, com a mediação dos sindicatos, é o caminho mais seguro para a construção de relações de trabalho modernas, seguras e sustentáveis.
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