Entenda a diferença entre contratação CLT e PJ

O trabalho é um direito humano essencial com vasta proteção legal, tanto nacional quanto internacional. Isso se deve ao fato de que o trabalho é uma das formas de garantir o pleno exercício da cidadania e a dignidade da pessoa humana (art. 1º, II e III; art. 6º, CF), seja por possibilitar a realização de projetos de vida, seja por assegurar a própria subsistência. Por ser uma fonte de realização pessoal e transformação social, os valores sociais do trabalho recebem tanta proteção.

Na Constituição Federal, por exemplo, esses valores são listados como fundamentos da República Federativa do Brasil, precedendo a livre iniciativa (art. 1º, IV, CF), apesar de haver entre eles uma relação complementar e dialógica. Além disso, a ordem econômica e financeira é baseada na valorização do trabalho, seguida pela livre iniciativa (art. 170, CF).

Acredita-se que o legislador estabeleceu essa ordem de maneira lógica, pois não se pode liberar a livre iniciativa sem antes definir regras claras que respeitem os valores sociais do trabalho.

Neste artigo, exploraremos as distinções entre vínculo empregatício e contratação como pessoa jurídica. Além disso, apresentaremos um caso prático para reflexão ao final do texto.

O que é o vínculo empregatício?

É a relação formal entre o empregador e o empregado. Para configurar esse vínculo, é necessário atender a alguns requisitos, conforme estabelecido pelo art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT):

Art. 3º – Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário

Os principais elementos caracterizadores da relação de emprego são:

  • O trabalho deve ser por pessoa física;
  • Deve haver pessoalidade, ou seja, a prestação de serviços não pode ocorrer por terceiros. O vínculo empregatício tem caráter de infungibildiade. Existem algumas exceções, que são os afastamentos legais, como, por exemplo, as férias, licenças, mandato de dirigente sindical. Tais afastamentos não prejudicam a pessoalidade do trabalhador, apenas suspendem ou interrompem o seu contrato.
  • Deve haver subordinação, sendo este o elemento crucial. É o elemento-fático jurídico da relação de emprego.

O conceito de subordinação pode dividir-se em três modalidades: a) Subordinação Econômica; b) Subordinação Jurídica; e c) Subordinação Social.

Subordinação Econômica está diretamente relacionada ao requisito da onerosidade do contrato de trabalho, sendo focada no pagamento do salário.

Subordinação Técnica ocorre quando o empregado possui maior capacidade financeira do que seu empregador. Nesse caso, o empregador detém apenas o domínio técnico sobre o empregado, que se torna um mero executor de tarefas.

Subordinação Jurídica baseia-se no poder de direção do empregador e no dever de obediência do empregado. Isso inclui a capacidade do empregador de punir o empregado por meio de advertências verbais ou escritas, suspensão ou até mesmo demissão por justa causa.

  • Não eventualidade, ou seja, para ser considerado relação de emprego o trabalho deve ser permanente, habitual.

A permanência e habitualidade podem ser caracterizados mesmo não ocorrendo todos os dias ou em jornadas menores.

Um vendedor, por exemplo, que trabalha na venda de ingressos de um teatro por 1h diária, ou um músico de um clube que trabalha apenas 2 vezes na semana, não são considerados eventuais, e, portanto, se enquadram em relação de emprego.

  • Onerosidade, é a contraprestação; quando o objetivo do empregado era o recebimento. E esse pagamento pode ser de várias formas: em dinheiro; em utilidades; parcelas fixas ou variáveis; pagamento diário, semanal ou mensal; etc.
  • Alteridade, quando o risco do negócio está no empregador e não se transfere ao empregado.

Quando dizemos que algum contrato será regido pela CLT, significa que aquele trabalhador será considerado empregado e terá direitos e garantias diferenciadas em relação as outras espécies de trabalhador. Os empregados terão direito à férias, 13º salário, aviso prévio, multa por dispensa sem justa causa, estabilidade, FGTS, horas extras, seguro desemprego, adicional noturno, etc.

Conhecer os requisitos que configuram uma relação de emprego é importante para que o trabalhador saiba se seus direitos estão sendo violados ou não, já que pode ocorrer de ser contratado como um trabalhador autônomo, mas possuir requisitos de empregado, devendo, portanto, receber os encargos trabalhistas da CLT. 

Vínculo Empregatício ou Contratação como Pessoa Jurídica?

O que é regime de Pessoa Jurídica?

O contrato PJ, denominado “autônomo” ou “freelancer”, permite que um profissional atue como uma empresa individual. Nesse modelo, o trabalhador emite notas fiscais pelos serviços prestados e assume responsabilidade por suas obrigações tributárias, previdenciárias e trabalhistas. Algumas das principais características do regime PJ incluem:

  • Autonomia: O profissional tem maior liberdade para definir seus horários de trabalho e a maneira como executa suas tarefas.
  • Flexibilidade: Permite ter múltiplos clientes simultaneamente e escolher os projetos que deseja aceitar.
  • Potencial para maiores ganhos: Em muitos casos, profissionais no regime PJ podem obter remuneração superior à dos contratados pelo regime CLT, devido à flexibilidade na negociação de valores.
  • Benefícios limitados: Os trabalhadores PJ não têm acesso aos benefícios típicos da CLT, como férias remuneradas, 13º salário, seguro-desemprego, FGTS, etc.
  • Responsabilidades fiscais: O profissional PJ é responsável pelo pagamento de seus impostos e contribuições previdenciárias, o que pode ser mais complexo e oneroso em comparação ao regime CLT.

Relação de emprego x “Pejotização”

O fenômeno da “pejotização” é frequentemente utilizado para disfarçar uma relação de emprego. Isso ocorre quando trabalhadores são contratados como prestadores de serviços, na qualidade de profissionais autônomos, pessoas físicas ou jurídicas, especialmente microempreendedores individuais (MEI), apesar de estarem presentes todos os requisitos fático-jurídicos da relação de emprego estabelecidos nos artigos 2º e 3º da CLT. Essa prática, ao fraudar direitos trabalhistas, previdenciários e fiscais, pode prejudicar toda a sociedade.

Quando os elementos caracterizadores da relação de emprego estão presentes (art. 2º e 3º, CLT), com base no princípio da primazia da realidade e no disposto no art. 9º da CLT, o contrato será considerado nulo e o vínculo empregatício será reconhecido entre o trabalhador e o tomador do serviço. O próprio STF, ao reconhecer a licitude da terceirização em qualquer atividade, excetuou os casos de fraude, os quais continuam a ser analisados pela Justiça do Trabalho.

No entanto, o Supremo Tribunal Federal tem revertido decisões que reconhecem o vínculo de emprego em casos de fraude decorrente da “pejotização”, baseando-se em julgamentos que consideram lícita a terceirização de qualquer atividade, mesmo sem relação direta com o caso específico.

A “pejotização”, quando utilizada para mascarar uma relação de emprego, é ilícita e não deve ser confundida com a terceirização lícita que pode envolver qualquer atividade do tomador de serviços.

Agora, vamos analisar uma decisão recente do Ministro Dias Toffoli sobre vínculo de emprego de um médico contrato como PJ:

O Ministro Dias Toffoli, em decisão monocrática na Reclamação Constitucional 65.612 (RS), havia julgado procedente a reclamação constitucional ajuizada por um hospital e ordenado que o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região proferisse um novo acórdão para afastar o vínculo de emprego entre o médico e o hospital. Os fundamentos do Ministro foram:

  • Existia a possibilidade de contratação de pessoa jurídica única para a prestação de serviços;
  • Havia “ausência de condição de vulnerabilidade na opção pelo contrato firmado que justificasse a proteção estatal por meio do Poder Judiciário mediante constituição de vínculo empregatício”;
  • O TRT 4ª afrontou tese firmada na ADPF nº 324 e no Tema nº 725 da Repercussão Geral ao reconhecer o vínculo em detrimento de contrato de prestação de serviços médicos firmado entre as partes.

Contudo, recentemente (junho/2024), o Ministro voltou atrás, cancelou a certidão de trânsito em julgado e reconsiderou sua decisão monocrática anteriormente proferida.

Alega o Ministro, na Reclamação 65.612 (RS), que não deixou de reconhecer a existência de precedentes do STF que consideraram lícita a “terceirização por ‘pejotização’”, por entender que essa prática se relaciona com a compatibilidade dos valores do trabalho e da livre iniciativa, sendo uma opção constitucionalmente admitida.

No entanto, após a interposição de agravo regimental pelo médico, alegando que nem toda contratação via PJ é válida, o Ministro reconsiderou sua decisão, conforme ficou consignado no acórdão do TRT da 4ª Região:

  • O contrato entre as partes (médico e hospital) perdurou por mais de 40 anos;
  • O médico atuava diretamente na atividade-fim do hospital;
  • Foi pactuado que a prestação de serviços ocorreria de forma contínua e permanente;
  • Havia subordinação hierárquica (poder de direção);
  • Existia subordinação jurídica, com o hospital tendo ingerência nas atividades do médico, que devia obedecer ordens;
  • O hospital elaborava a agenda de consultas e procedimentos, organizando as cirurgias a serem realizadas pelo médico (subordinação jurídica);
  • O hospital cobrava metas;
  • Os médicos eram obrigados a constituir pessoa jurídica para poder desempenhar suas funções no hospital;
  • O médico só poderia ser substituído por outro médico do próprio hospital, “não podendo trazer alguém de fora”.

A conclusão do Ministro foi de que a reclamação constitucional ajuizada pelo hospital demandaria o revolvimento e reexame de fatos e provas do caso concreto, o que é incompatível com a via reclamatória. Pela lei e pela natureza do Supremo, não cabe à corte reanalisar fatos e provas, o que tem ocorrido nestas reclamações contra vínculo.

“Tem-se, portanto, que a presente reclamação veicula irresignação contra decisão fundada no conjunto fático-probatório do Processo nº 0020063-56.2022.5.04.0772, de modo que a pretensão dos autos demanda o revolvimento e reexame de fatos e provas do caso concreto, incompatível com a via reclamatória”, concluiu Toffoli.

Fontes: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/pj-x-clt-entendendo-as-diferencas-e-escolhendo-o-melhor-regime/2150548006
https://www.jota.info/stf/do-supremo/toffoli-reconsidera-decisao-e-mantem-vinculo-entre-medico-contratado-como-pj-e-hospital-02072024

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